— 04 de dezembro de 2023
Esta parceria celebrada na Coleção Handred Sergio Rodrigues não é apenas sobre roupas, mas sobre identificação, sobre legado e sobre fazeres. Há todo um cheiro inebriante de nostalgia no ar, movimentos que prendem o olhar e estampas que arrancam sorrisos. O modernismo despido do passado e vestido de liberdade, no seu sentido mais amplo. LEIA MAIS

"Quando o Tupinambá foi à mata, viu Jacarandá. Se tivesse ido à Ipanema, teria visto Sergio Rodrigues. Sergio é madeira de lei, nobre metamorfose. É a tradução do Rio de Janeiro que a gente quer. Inspiração para aqueles que buscam excelência", celebrou certa vez Ivan Rezende para Adélia Borges.

A frase que referencia Sergio Rodrigues (1927-2014) nos faz compreender seu tamanho diante da imensidão do Brasil. Foi Sergio quem realmente se debruçou em responder o que nos faz genuinamente sermos nós mesmos, o que nos entende como brasileiros. A missão quase impossível, a pergunta de um milhão de cruzados, foi respondida lançamento após lançamento ao longo de seis décadas. 

E quando falo lançamento, pode soar para muitos como algo efêmero, mas Sergio não era desses, seu humor e envolvimento, o faziam ser avesso ao dogmatismo. Acreditava sim no novo, mas não na urgência de inovação com que estamos acostumados atualmente e a partir dessa filosofia de vida que comecei a ver as intersecções entre ele e a Handred. 


Quando em 1955, abriu as portas da Oca, nome provocativo que faz alusão ao genuinamente elementar e, consequentemente, brasileiro, encontramos outros denominadores comuns entre o passado, presente e futuro, que deram as mãos para que este projeto tomasse forma e, a coleção, vida. 

"Tudo é um sinal para quem está atento", sempre repetiu minha mãe e a crendice tem sentido, inclusive aqui. Em 1957, quando deu vida à emblemática poltrona Mole, o mundo estava em estado de transformação e fantasia, a nave Sputnik levava a cadela Laika para fora da nossa órbita. Enquanto aqui, em terra firme, Amílcar de Castro, Geraldo de Barros, Lygia Clark, Lygia Pape, Willys de Castro, Hélio Oiticica e, claro, Sergio, propunham outros e novos universos. 


Esbocei as primeiras palavras deste jornal que está em suas mãos coincidentemente em uma poltrona mole, ela me abraça, me recebe e me faz esparramar em liberdade. Essa equação é sentida também nas roupas que André Namitala, diretor criativo, propõe. Há fluidez, convite e funcionalidade, que coexistem em harmonia. 

Universos que não colidem, mas orbitam, assim como a lua rege misteriosamente as ondas do mar, os códigos de Sergio e André dialogam, improváveis e íntimos. Quem diria que madeira, seda, linho e shantung receberiam o mesmo toque? Algo que só quem entende o saber manual consegue enxergar, ou melhor, sentir. 

Esta parceria celebrada na Coleção Handred Sergio Rodrigues não é apenas sobre roupas, mas sobre identificação, sobre legado e sobre fazeres. Há todo um cheiro inebriante de nostalgia no ar, movimentos que prendem o olhar e estampas que arrancam sorrisos. O modernismo despido do passado e vestido de liberdade, no seu sentido mais amplo. 


Segundo Sergio, a madeira representava o "precário, o provisório", fazendo com que nós latinos tivéssemos preconceito, algo que acontece de forma parecida com a moda, que mesmo sendo sazonal e supostamente impetuosa, pode nos fazer desejar também o para sempre, o que fica, o permanente. 

Do Instituto aos ateliês que se uniram e trocaram confidências e aprendizados ao longo dos últimos dois anos, notamos que este lançamento não é apenas sobre lançar, mas principalmente sobre celebrar os encontros e enxergar nas pistas coincidências que unem possibilidades e os desejos mais íntimos. Sobre interior e sobre o da porta para dentro. Bem-vindo. 

Por Vinicius Alencar.