Vivian Caccuri nascida em São Paulo (1986) e radicada no Rio de Janeiro, é uma artista multimídia que se interessa nas reverberações do som a partir de um contexto social e político. Com ateliê em um prédio na região portuária que já abrigou uma fábrica, e partindo de tecnologias analógicas e digitais, ela propõe instalações, desenhos, objetos, vídeos, performances e trilhas sonoras que desafiam a normatividade, o senso comum e levam em consideração a sensação vivida pelo “outro”.

Por não serem obras meramente contemplativas, há uma experiência ambiental, principalmente nas instalações, onde Caccuri se utiliza de frequências sonoras como as ondas de comprimento curto, o grave, em que para além da escuta há a percepção da vibração sentida no corpo.

Dos variados desdobramentos de suas investigações, a relação da música no contexto litúrgico religioso em contraste com o festivo mundano tem destaque. Analisando interseções e particularidades de experiências de catarse que podem tanto ser experimentadas em uma rave com som eletrônico, como em um ritual de candomblé ao som de percussão ou em uma missa ao som de um órgão, por exemplo, Caccuri produziu obras em que figuras humanas estão imersas em ondas sonoras em epifania. Uma delas é Arrebatamento II de 2022, um objeto de parede em larga escala, composto por trama sintética, pintura e bordados com representação de uma circunstância de Fim dos Tempos. Nela, figuras humanas emergem das águas em direção ao céu onde um sistema de som paira em meio a ondas gráficas de amplitude e comprimento diversos, remetendo a uma catarse.

Atento à produção artística contemporânea, André Namitala, estilista a frente do ateliê da marca Handred, ao ter contato com o ateliê de Vivian Caccuri, encantou-se com o fazer artístico envolvendo manualidade no uso das tecidos, telas, sobreposições e bordado, caros também à prática do estilista. Arrebatamento II já citada, foi uma das obras que chamou sua atenção, assim como Mosquito Shrine IV, que propõe uma nova mitologia onde mosquitos transformados em humanos curtem uma festa, em que seus corpos se multiplicam, em total desbunde ao meio de ondas sonoras, lágrimas e bebidas. Tais corpos de diversos biotipos são representados em bordado com linha de algodão sobre tela de mosquiteiro, encerrados por uma franja de carrilhões que emitem sons agudos ao se encontrarem.

Vivian também começa a frequentar o ateliê de moda de André, acompanhando a produção das roupas e atenta ao manejo dos materiais. Vestindo a marca no seu dia-a-dia, criou intimidade com a proposta de modelagem, texturas e sensações pela qual a marca Handred é conhecida. Dado interesse de colaboração entre os dois ateliês, surge a coleção ENTRE-ONDAS onde signos do repertório da artista e do estilista se mesclam em uma produção em que há um tratamento atencioso das estampas e bordados que encontram novas configurações espaciais e da alfaiataria em tecidos delicados como seda, organza, linho e algodão que encontram o ruído do streetwear tanto nas silhuetas quanto por exemplo no uso de elementos brutos como pedras ardósia, pirita e turmalina negra, aplicados como ornamentos. Essa colaboração é uma celebração do analógico, do manual, da riqueza de detalhes e paixão pela criação, rompendo os limites entre obra de arte e vestimenta.

Por Ademar Britto, curador de arte.

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